Traí, e agora?

Author: Alexandre Shimura , 01/02/2024 (86 views)
Relationship difficulties, Emotional breakdowns, Sexuality
Traí, e agora?

A traição é o fim de um relacionamento? Ou um alerta de mudança? O envolvimento em um caso extraconjugal pode dizer muito mais do que as opinões e suposições imediatas revelam.

A fidelidade conjugal é um pressuposto em praticamente todos os relacionamentos amorosos e mesmo nas chamadas relações abertas existe algum acordo neste sentido. Pactos de fidelidade e lealdade são essenciais para o início e prosseguimento do relacionamento, formando a base onde se alicerça a confiança e segurança. Neste sentido, existem casais que fazem acordos e combinados mais claros e discutidos, enquanto que outros optam por deixar implícito. Essas abordagens fazem muita diferença nos momentos de crise e na forma como cada um lida com os seus próprios desejos.

A traição acontece pelos mais diversos motivos, dependendo da dinâmica relacional, da intimidade, dos papéis que cada um assume implícita ou explicitamente, do peso das expectativas que um tem sobre o outro e sobre si mesmo. Além disso, os motivos tem relação com o contexto social e cultural e podem ser significativamente diferentes para homens e mulheres, com diferentes impactos para o casal, família e círculo social (isso mesmo, também não há igualdade de gênero quando falamos de traição).

Você, caro leitora ou leitor, tem grandes chances de ter vivenciado esta situação em algum relacionamento ou, no mínimo, conhece pessoas próximas que passaram por isso. Quando ainda não foi descoberta, a existência de um caso extraconjugal pode ser fonte de angústia para aquele(a) que o mantém e certamente afeta a relação do casal. Quando vem à tona, via de regra, a traição causa um turbilhão no relacionamento e pode ter diversos desfechos, como a separação, a instalação de uma relação permanentemente conflituosa (recheada de desconfianças e “vinganças” de parte a parte, que às vezes até alimenta e impulsiona a vida sexual), indiferença e distanciamento emocional e até a aproximação dos parceiros(as) e transformação positiva da relação. O que define o impacto de uma infidelidade, revelada ou não, são fatores como a dinâmica do casal, tempo de convivência, contexto de vida, dependência financeira e/ou emocional, maturidade e outros tantos. Além disso, tem importância fundamental a maneira como a pessoa que foi infiel enfrenta e aborda a situação, o que pode ser essencial na definição do futuro.

Você traiu? Veja o que pode fazer a partir de agora.

Descubra sua motivação: embora seja tentador e um milhão de vezes mais fácil atribuir a traição a algo externo (um parceiro ou parceira que não te dá atenção ou não te satisfaz, uma “oportunidade”, etc.) ou a algo que não se possa controlar (como um desejo ou necessidade intensa), há sempre importantes motivações internas que precisam ser identificadas. Talvez para você seja essencial se sentir admirada(o) ou desejado(a); talvez tenha necessidade de maior intimidade ou sexo; ou ainda acredite que este outro relacionamento não afetará seu casamento ou namoro. Qualquer que seja o motivo, houve uma quebra na confiança e é importante identificar o que isto representa para você. Reflita sobre suas motivações e o impacto da infidelidade no modo como você enxerga seu parceiro(a) e sua relação. Mas este é um primeiro momento e vá com calma. Existe a ocasião mais propícia para conversar sobre essas coisas, com o cuidado adequado. Antes, você precisa ouvir.

Ouça seu parceiro ou parceira: após refletir, terá uma ideia do significado da sua traição para você e para a sua relação. Mas essa é apenas sua visão e é imprescindível ouvir o outro: em quais aspectos o afetou emocionalmente, a intensidade do sofrimento e como a quebra da confiança impactou o relacionamento e a visão dele sobre você. Ouvir atentamente e não entrar em embates com acusações mútuas. Na medida do possível, acolher e respeitar seus sentimentos. Não vai ser fácil, serão várias conversas, por vezes permeadas por uma raiva tão grande que será recomendável deixar para outro momento, quando os sentimentos estiverem menos intensos. Mas não deixe de escutar.

Reconheça o sofrimento que causou: quase sempre existe uma necessidade de justificar para si mesmo a traição. Você pode ter mil motivos e achar que tem toda a razão de ter sido infiel. Ou pode estar angustiada(o), culpado(a) e arrependida(o). Pode, ainda, variar entre estes dois pólos, sentido-se ora de um jeito, ora de outro, em graus diferentes. Mas isso tudo não anula o sofrimento do outro e ser sensível a isto é fundamental para a relação, qualquer que seja o seu desfecho. Você não se importa como sofrimento do seu parceiro ou parceira? Reflita se isto acontece porque esta relação não representa mais nada para você, porque está muito magoada(o) ou simplesmente porque está sendo egoísta. Se arrependeu e não quer se separar? Pedir desculpas sinceras não fere a dignidade de ninguém.

Fale de suas necessidades: vocês tiveram algumas conversas e já estão conseguindo dialogar melhor, sem tantos rompantes de raiva e acusações mútuas. Decidiram ficar juntos ou estão caminhando neste sentido. Talvez seja o momento de estabelecer novos parâmetros da relação e para tanto é importante falar das suas necessidades emocionais, das pequenas e grandes coisas da relação que te trazem sofrimento, daquilo que impede seu crescimento. Mas atenção: se você tem coisas importantes a serem ditas, isto muito provavelmente acontece desde antes da traição, então não as use como justificativa.

Atente às necessidades do outro: seu parceiro ou parceira está ferida(o) e magoada(o), afetando profundamente os sentimentos, intimidade e confiança que ela ou ele acreditava existir entre vocês. A continuidade da relação e a restabelecimento da confiança vão ocorrer em outros patamares, exigindo esforço e disposição. Talvez você tenha que ceder temporariamente em alguns pontos que não gostaria e se assim for é importante que fique claro que se trata de uma situação excepcional.

Lembre-se, muitas vezes o contexto no qual vocês vivem tem uma relação significativa com a infidelidade (nascimento de um filho, doença na família, excesso de trabalho, etc.). Este é um aspecto que deve ser considerado entre todos os outros. Não caia na tentação de, nesta hora, justificar a situação por uma coisa externa.

Trouxe aqui alguns pensamentos sobre aspectos importantes que podem ajudar um casal em crise provocada por uma infidelidade. Não há receita pronta e tudo deve ser avaliado e refletivo sob uma perspectiva pessoal e singular. Casais com dinâmicas disfuncionais (assunto que abordei em outro texto) e casais que construíram a relação baseada na intimidade e respeito mútuo enfrentarão esta situação de formas muito diferentes. O que importa é a consideração e o respeito por si e pelo outro e, independente do desfecho, sair desta situação diferente e, quem sabe, melhor.

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